Tentativa de golpe: entenda as estratégias por trás das alegações das defesas de Bolsonaro e demais réus

Tentativa de golpe: entenda as estratégias por trás das alegações das defesas de Bolsonaro e demais réus


Além de pedir a absolvição pela acusação de tentativa de golpe de Estado em 2022, as defesas dos réus apontados como integrantes da trama golpista apresentaram, nas alegações finais, teses jurídicas destinadas a influenciar a definição das penas, caso haja condenação. As conclusões de sete acusados — entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro — foram encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última quarta-feira (13).
Os advogados entregaram ao tribunal um resumo do caso e suas interpretações jurídicas sobre as provas e informações produzidas ao longo do processo penal.
O principal pedido é pela absolvição, seja por alegada falta de provas, seja porque os crimes não teriam sido configurados.
As defesas também apresentaram pedidos alternativos, para serem considerados caso a Primeira Turma do STF entenda que deve haver condenação.
Entre eles, estão questionamentos sobre o enquadramento das condutas nos crimes apontados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e a tentativa de evitar a soma das penas — como propôs a PGR —, que poderia levar a até 43 anos de prisão, considerando os limites máximos previstos na lei.
A PGR, na denúncia, diz que o núcleo crucial capitaneou a tentativa de golpe que visava manter Bolsonaro no poder.
Os réus desse núcleo são:
Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin;
Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
Augusto Heleno, ex-ministro do GSI;
Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência;
Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil.
Veja abaixo os principais pontos levantados pelas defesas do chamado “núcleo crucial” da trama golpista:
ausência de provas;
discussão sobre atos de preparação e execução dos crimes;
debate sobre a tentativa nos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado;
questionamento sobre a existência de organização criminosa armada;
ausência de ligação com os atos de 8 de janeiro;
contestação à aplicação simultânea dos crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
alegação de desistência voluntária;
questionamentos à proposta de soma das penas.
Defesas de réus na ação da trama golpista entregam ao STF alegações finais
Provas
A defesa de Alexandre Ramagem afirmou que os documentos apreendidos eram anotações pessoais “sem qualquer ilegalidade” e que não sustentam a acusação de que ele teria trabalhado para desacreditar o sistema eletrônico de votação.
Advogados de Paulo Sérgio Nogueira alegaram inexistir um conjunto probatório capaz de ensejar condenação. Representantes de Almir Garnier apontaram “fragilidade das provas” para vincular o acusado aos fatos narrados.
Atos de preparação e execução dos crimes
As defesas de Paulo Sérgio Nogueira, Braga Netto e Augusto Heleno questionam a classificação de determinadas ações como atos executórios. Pela lei penal, atos preparatórios não são puníveis, salvo se constituírem, por si mesmos, crime. Para Nogueira, reuniões, lives, elaboração de planos e monitoramento de autoridades seriam apenas preparatórios, sem início de execução.
A defesa de Braga Netto negou envolvimento em planos de monitoramento ou assassinato de autoridades e afirmou que as condutas atribuídas não ultrapassaram a fase de preparação. Já os advogados de Augusto Heleno argumentaram que reuniões e minutas de decretos demonstram intenção, mas não configuram início de golpe.
Ex-presidente Jair Bolsonaro deixa a sede do Partido Liberal em Brasília, Brasil, em 24 de julho de 2025.
Jorge Silva/Reuters
Caracterização da tentativa em dois crimes
As defesas de Bolsonaro, Braga Netto e Nogueira questionaram o enquadramento simultâneo como tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Para Bolsonaro, isso criaria uma “tentativa da tentativa”, vedada pelo ordenamento jurídico.
A PGR, no entanto, afirma que, nesses casos, basta que as ações tenham potencial de romper a ordem constitucional, com uso de violência ou ameaça, mesmo sem ordem formal assinada.
Organização criminosa armada
Bolsonaro e Garnier também rejeitam o enquadramento nesse crime, afirmando que não houve estrutura organizada nem uso de armas sob seu comando. A PGR sustenta que houve ameaça de violência, o que autoriza aumento de pena.
Ausência de ligação com 8 de janeiro
As defesas de Bolsonaro e Garnier afirmam que não existe prova de relação direta entre as condutas atribuídas e os atos antidemocráticos que resultaram na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes.
Aplicação simultânea de dois crimes contra a democracia
As defesas de Ramagem, Heleno, Braga Netto, Anderson Torres e Garnier defendem que não é possível condenar, ao mesmo tempo, por golpe de Estado e por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, já que um implicaria o outro. A PGR defende a autonomia dos delitos e a soma das penas.
Desistência voluntária
A defesa de Bolsonaro sustenta que, ainda que se considerasse a intenção, ele não levou adiante as medidas — como Estado de Defesa ou de Sítio —, o que caracterizaria desistência voluntária. Argumentam que, se quisesse, poderia ter substituído comandantes militares contrários à ideia.
Soma das penas
Bolsonaro e Anderson Torres contestam a soma das penas proposta pela PGR, que pode levar a condenações de até 43 anos. Para a acusação, as condutas foram autônomas e com objetivos distintos, o que justifica o cálculo acumulado.