Sem enfrentar gastos obrigatórios, governo perde legitimidade para propor ampliação de tributos

Haddad em 3 de junho de 2024
Reuters/Adriano Machado
Ao não enfrentar a pauta dos crescimento explosivo dos gastos obrigatórios, o governo perde a legitimidade para propor equalização de impostos e cortes de benefícios fiscais, que sempre são lidos no Congresso como mudanças arrecadatórias.
O pacote negociado com a cúpula da Câmara e do Senado, que resultou na medida provisória publicada nesta quarta-feira, não trouxe as chamadas medidas estruturantes.
O governo não tocou nos explosivos gastos obrigatórios, não colocou na mesa de negociação a desvinculação de benefícios sociais do salário mínimo e sequer comprou o desgaste de propor limites para o aporte do Executivo ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) – outra das pautas bombas aprovadas pelo Congresso nos últimos anos.
Claro que todos os governos fogem de medidas impopulares quanto mais se aproximam as eleições gerais. Mas a opção do governo Lula desde o primeiro ano deste mandato foi ajustar as contas via aumento de arrecadação.
A situação fiscal estaria um pouquinho melhor se o Planalto não tivesse combinado com o Senado, no final do ano passado, o veto de limitações à concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) – aprovado pela Câmara dos Deputados. Mais uma vez, tanto senadores quanto Lula acharam que não valia o desgaste popular.
Por outro lado, sobram medidas populistas que encarecem a conta de luz e elevam o endividamento do país, puxando os juros para níveis cada vez mais altos.
Governo publica novo pacote de medidas tributárias para substituir o IOF
Como o Congresso pode debater a proposta da Fazenda de ampliar a isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil quando o país não consegue fechar suas contas no azul (sem gambiarras e calotes nos precatórios) há mais de uma década?
A reação dos deputados e senadores é também eleitoreira, já que cobram cortes de gastos mas não aceitam diminuir o volume de emendas parlamentares que, além de estratosférico, não representa gasto de qualidade para a população brasileira.
A defesa dos setores altamente organizados no Congresso – do agro às bets, passando por incentivos regionais sem prazo para acabar – deixa em segundo plano a saúde financeira do país.
Sem a reversão do endividamento crescente, o Brasil estará condenado a nunca entrar no time de países com credibilidade para ter acesso a grandes investimentos internacionais.
A crise causada pelo decreto que aumentava o IOF precisa servir para um debate profundo sobre as contas públicas.
Não só a situação já é disfuncional, como se tornará insustentável nos próximos 18 meses. Não é apenas a reeleição de Lula que está em jogo, é o destino político de todos os parlamentares que ocupam hoje o Congresso Nacional.