Família de Cid: advogados de Bolsonaro queriam defesa conjunta e ligavam para filha menor de idade do delator

Família de Cid: advogados de Bolsonaro queriam defesa conjunta e ligavam para filha menor de idade do delator


Mãe do ex-ajudante de ordens do que aproximações eram “muito constrangedoras”; telefone da filha do casal foi entregue para perícia. Em interrogatório, Mauro Cid afirma que Bolsonaro recebeu, leu e alterou a chamada minuta do golpe
Familiares do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, delator da trama golpista, relataram à Polícia Federal (PF) terem sofrido insistentes contatos de advogados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Segundo Agnes Cid, mãe do delator, eles queriam que todos tivessem uma defesa única.
“Essas tentativas de aproximação eram muito constrangedoras, porque eu sabia o que eles queriam, basicamente, que trocássemos de advogados e que fossem todos ligados a uma única defesa”, relatou Agnes.
A declaração dela, entregue por escrito ao STF (Supremo Tribunal Federal), é datada da última segunda-feira (23). Foi feita dentro da notícia-crime peticionada por Mauro Cid após o advogado Eduardo Kuntz pedir a anulação da colaboração premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, por supostamente ter mantido conversas com o delator, obrigado a manter sigilo sobre o que havia dito.
Agnes disse ter sido procurada três vezes, entre agosto e dezembro de 2023, pelo advogado Eduardo Kuntz, defensor de Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro. Na primeira vez, ele foi sozinho à Hípica, em São Paulo, onde a filha de Cid estava competindo. Na segunda, ele já foi acompanhado por Paulo Bueno, defensor do ex-presidente.
“Naquele momento, não perguntaram nada sobre a colaboração, até porque eu também não saberia [responder]. Porém, se ofereceram para que eu falasse com Mauro que eles poderiam defendê-lo e que eram amigos”, contou.
A defesa de Mauro Cid pede que, caso seja encontrada alguma ilicitude, a OAB seja acionada para verificar possíveis infrações éticas de Kuntz e Wajngarten.
A mulher do delator, Gabriela, também entregou uma declaração assinada. Ela contou que Fábio Wajngarten, advogado que foi secretário de Comunicação do governo Bolsonaro, telefonou “diversas vezes”, mas que não atendia essas ligações. Só atendeu a pedido da filha, de 14 anos, porque ela também era alvo de “ligações constantes e insistentes” por parte dele.
“Isso aconteceu assim que Mauro passou a ser defendido pelo Dr. Cezar Bitencourt. Ele me dizia que tinham diversos advogados muito melhores, que poderiam fazer a defesa dele”, detalhou. Ela contou ainda ter gravado a ligação para se resguardar, caso tivesse problemas com a Justiça. Decidiu apagar depois, no entanto, porque sentiu que não estaria fazendo o correto e que ele poderia só estar querendo ajudar.
Cid também prestou depoimento e falou sobre as supostas conversas que teria tido com o advogado Eduardo Kuntz, reveladas por ele mesmo, por meio do perfil “Gabrielar702”. O ex-ajudante de ordens negou ter mantido diálogo com o defensor de Marcelo Câmara e disse não saber quem criou o perfil citado.
O delator também relatou tentativas de aproximação de Kuntz com sua filha, menor de idade, entre agosto de 2023 e o início de 2024. Disse que ele usou como artifício assuntos relacionados ao hipismo, já que ela é atleta da modalidade.
Conforme o termo de declaração, Cid disse não ver motivo para Kuntz manter contato constante com sua filha, porque “não tinha relação próxima com o advogado”. E que acredita que ele o fez “para obter informações sobre o acordo de colaboração firmado pelo declarante e, com isso, obstruir as investigações em andamento, aproveitando-se da inocência de sua filha menor de idade”.
Na petição apresentada pelos advogados de Cid, há alguns detalhes de como foram essas conversas. Kuntz teria dito à filha de Cid que, toda segunda-feira, ele fazia uma limpeza no celular, “evidentemente na tentativa de que G.R.C. também o fizesse”, argumentam.
Eles também entregaram o telefone da filha para que pudesse ser periciado.
Procurado, o advogado Paulo Bueno preferiu não se manifestar. Já Kuntz disse que, dada a “indevida interpretação” da sua atividade profissional, irá se manifestar nos autos, “inclusive para preservar a menor”. “Destaco, apenas, que tais documentos são muito importantes para reforçar que a prisão do meu cliente (coronel Marcelo Câmara) é desnecessária e, consequentemente, ilegal”, completou.
Fábio Wajngarten não retornou o contato.