Demissões no Itaú: trabalhador pode ser monitorado em home office? Qual o limite? Veja o que diz a lei

Demissões no Itaú: trabalhador pode ser monitorado em home office? Qual o limite? Veja o que diz a lei


Itaú demite funcionários após avaliar produtividade no home office
O Itaú demitiu nesta semana cerca de 1 mil funcionários em regime híbrido ou remoto, segundo o Sindicato dos Bancários. A decisão foi tomada após uma avaliação da produtividade no home office.
Em nota enviada ao g1, o banco diz que a decisão foi tomada após uma “revisão criteriosa de condutas relacionadas ao trabalho remoto e registro de jornada”. Haveria, assim, incompatibilidade entre as atividades e o registro de ponto dos trabalhadores. (veja nota completa)
📱Baixe o app do g1 para ver notícias em tempo real e de graça
➡️ O caso reacendeu o debate entre especialistas em trabalho e emprego sobre os mecanismos de avaliação da produtividade no home office. Como medir a produção? É adequado monitorar o computador do empregado?
🔎 Segundo a advogada trabalhista Luana Couto Bizerra, as empresas podem instalar softwares de monitoramento nos computadores corporativos para controlar jornada, produtividade e segurança da informação.
A prática é prevista na legislação trabalhista, desde que adotada com transparência, proporcionalidade e finalidade legítima.
O controle de jornada e produtividade deve ocorrer por meios adequados, como ponto eletrônico ou metas, evitando excessos que possam constranger o empregado.
Além disso, a empresa deve respeitar a privacidade do trabalhador e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
“Exigir câmera ligada o tempo todo não é permitido. O uso deve ser pontual e justificável, como em reuniões ou treinamentos”, diz a especialista.
“O ponto sensível surge quando a empresa não fornece equipamento e busca instalar o monitoramento no computador pessoal do empregado. Nessa hipótese, há risco de invasão à intimidade e à vida privada”, completa a especialista.
Fachada de agência do Itaú Unibanco
Divulgação
Direito à desconexão
Outro ponto destacado pela especialista é que o controle de jornada deve respeitar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o chamado “direito à desconexão”.
🔎 Em outras palavras: o empregador pode exigir registro de ponto eletrônico ou outros meios de controle, mas isso não significa que o trabalhador precise estar disponível o tempo todo.
É essencial respeitar os intervalos e as necessidades pessoais do trabalhador. Além disso, tempo de tela não indica, por si só, indisponibilidade: o empregado pode estar executando tarefas que não exigem interação direta com o computador.
Assim, sistemas que medem apenas a movimentação do mouse ou teclado podem gerar informações incompletas ou distorcidas sobre a real produtividade e a efetiva dedicação às tarefas.
Muitos funcionários realizam tarefas como análise de documentos, atendimento a clientes por telefone, planejamento estratégico e outras atividades cognitivas ou de comunicação que não ficam registradas na tela.
Um ex-funcionário do setor de marketing do Itaú que prefere não ser identificado afirmou que passava boa parte da jornada usando celular ou televisão para estudar conteúdos destinados às mídias da instituição.
Ele conta que o tempo de trabalho fora do computador não era monitorado, embora gestores incentivassem os funcionários a buscar referências em redes sociais.
“O banco não fornecia celular para todos. Em 2025, com o uso generalizado do WhatsApp, apenas coordenadores e gerentes tinham aparelhos corporativos. Assim, o trabalho fora do computador não era monitorado”, relata o ex-colaborador.
Dispensa sem aviso
O sindicato dos bancários criticou a decisão do Itaú, afirmando que os trabalhadores foram demitidos sem advertência prévia e sem diálogo com a entidade, “num claro desrespeito aos bancários e à relação com o movimento sindical”.
“O banco afirma que os desligamentos se baseiam em registros de inatividade nas máquinas corporativas, em alguns casos, períodos de quatro horas ou mais de suposta ociosidade”, disse Maikon Azzi, diretor do sindicato e funcionário do Itaú, em nota.
“No entanto, consideramos esse critério extremamente questionável, já que não leva em conta a complexidade do trabalho bancário remoto, possíveis falhas técnicas, contextos de saúde, sobrecarga, ou mesmo a própria organização do trabalho pelas equipes”, acrescentou.
Para Leyla Nascimento, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH Brasil), antes de uma demissão é esperado que o trabalhador receba feedback sobre o desempenho. Porém, a advertência formal não é obrigatória.
“Antes de qualquer demissão, o acompanhamento constante da liderança é essencial”, afirma a especialista.
Trabalhadores demitidos ouvidos pelo g1 afirmam que não receberam avaliações negativas e, em alguns casos, chegaram a ser premiados internamente pelo bom desempenho. Também relataram dificuldades diárias para registrar o ponto eletrônico.
“Eu não esperava. Estava em um programa de desenvolvimento individual (PDI), sempre com feedbacks positivos e recebendo mais funções. Independentemente de trabalhar 8h ou 3h, nunca houve questionamento se as entregas fossem feitas no prazo”, relata um ex-colaborador.
Outro ex-funcionário também foi surpreendido pela demissão: “Havia momentos de ociosidade na área em que atuei, mas sempre informei meus líderes sobre as demandas em andamento e quando estavam concluídas”.
Home office
Pexels/Vlada Karpovich
Boas práticas para o home office
O trabalho remoto não é novidade, mas ganhou força durante a pandemia de Covid-19. Ainda assim, especialistas alertam que não há consenso global sobre a melhor forma de avaliá-lo.
Como mostrou o g1 em fevereiro, cada vez mais empresas têm retornado ao modelo presencial, citando dificuldades de produtividade e integração de equipes. Em São Paulo, a taxa de vacância em prédios corporativos caiu aos menores níveis desde o início da crise sanitária em 2020.
Para Leyla Nascimento, é fundamental haver um acordo claro entre empresa e trabalhador sobre direitos, deveres e formas de acompanhamento. Ela afirma que o monitoramento é necessário para preservar a relação de confiança entre profissional e empregador.
“Tanto no presencial quanto no remoto, o profissional está sendo acompanhado. Ao aceitar o trabalho híbrido, o empregado deve compreender que o monitoramento diário faz parte da rotina da empresa”, explica a presidente da ABRH.
Ela também aponta desafios emocionais do trabalho remoto, como dificuldades de concentração e sensação de isolamento, fatores que impactam a produtividade e reforçam a necessidade de acompanhamento contínuo.
Para o advogado trabalhista Maurício Corrêa da Veiga, as boas práticas no home office incluem fornecimento de equipamentos, capacitação adequada, definição de regras claras, monitoramento proporcional, respeito à privacidade e ao direito à desconexão.
Do lado dos funcionários, isso significa cumprir horários e metas, comunicar problemas técnicos, manter postura profissional e zelar pelos equipamentos e informações da empresa.
De acordo com especialistas, o trabalho remoto exige disciplina, flexibilidade e confiança mútua. O monitoramento deve ser entendido não apenas como controle, mas como ferramenta de acompanhamento de resultados — sempre com respeito aos direitos e à privacidade do trabalhador.
Defender home office nas redes custou o emprego deles