Governo Trump cancela visto de secretário do Ministério da Saúde por relação com programa ‘Mais Médicos’

Governo Trump cancela visto de secretário do Ministério da Saúde por relação com programa ‘Mais Médicos’


Marco Rubio
REUTERS/Umit Bektas
O governo Trump anunciou a revogação dos vistos de Mozart Júlio Tabosa Sales, secretário do Ministério da Saúde do Brasil, e Alberto Kleiman, um ex-funcionário do governo brasileiro, nesta quarta-feira (13).
A decisão foi revelada pelo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, na rede social X. Sem citar nomes, ele afirmou que estava tomando medidas para revogar vistos de vários funcionários do governo brasileiro.
Também disse que o programa Mais Médicos, em que o governo federal brasileiro contratou cubanos para conseguir preencher vagas no Sistema Único de Saúde (SUS), foi “um golpe diplomático inconcebível”.
“O Departamento de Estado também está tomando medidas para revogar vistos e impor restrições de visto a vários funcionários do governo brasileiro e ex-funcionários da OPAS, cúmplices do esquema de exportação de trabalho forçado do regime cubano. O Mais Médicos foi um golpe diplomático inconcebível de ‘médicos’ estrangeiros”, afirmou o secretário, citando a Organização PanAmericana da Saúde.
Em um post anterior, Rubio contou que estava impondo restrições de visto a autoridades dos governos africanos, cubanos e granadinos – e seus familiares – devido a acusações de que eles privaram os cubanos de cuidados médicos essenciais.
De acordo com comunicado divulgado no site do departamento americano, os atingidos pelas restrições “foram responsáveis ou envolvidos na cumplicidade do esquema coercitivo de exportação de mão de obra do regime cubano, que explora trabalhadores médicos cubanos por meio de trabalho forçado”.
“Esse esquema enriquece o corrupto regime cubano e priva o povo cubano de cuidados médicos essenciais. (…) Dezenas de médicos cubanos que atuaram no programa relataram ter sido explorados pelo regime cubano como parte do programa”, argumenta o documento.
O que era o Mais Médicos?
O programa Mais Médicos foi criado em 2013 pelo então governo Dilma Rousseff (PT) para levar profissionais de medicina às periferias das grandes cidades e a municípios do interior.
Na ocasião, porém, sofreu críticas por parte de parlamentares da oposição e de entidades médicas por prever a possibilidade de médicos estrangeiros poderem atuar.
Isso porque a maioria desses profissionais era de Cuba, fruto de uma parceria do governo brasileiro com a Organização Panamericana de Saúde (Opas), escritório regional da Organização Mundical de Saúde (OMS).
No governo Jair Bolsonaro (PL), o Ministério da Saúde trocou o nome do programa para “Médicos pelo Brasil”. A participação dos profissionais de Cuba foi encerrada em 2018, após a eleição de Bolsonaro, por iniciativa de Havana.
Desde então, os cubanos só podem atuar caso passem pela prova de validação do diploma em território brasileiro.
Relançado em 2023, o Mais Médicos conta hoje em dia com cerca de 24,7 mil médicos atuando em 4,2 mil municípios. No edital mais recente, 3.173 médicos selecionados iniciaram suas atividades em 1.618 municípios e 26 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) no início de julho de 2025.
O programa prioriza médicos brasileiros registrados no CRM, brasileiros formados no exterior e estrangeiros habilitados.
Moraes e outros ministros já haviam tido vistos revogados
Secretário de Trump anuncia revogação do visto americano de Alexandre de Moraes e de ‘seus aliados’
Em julho, os Estados Unidos já haviam suspendido os vistos de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), e de outros sete ministros do tribunal.
Na sexta-feira (18), Marco Rubio, secretário de Estado do governo Donald Trump, que cuida das relações dos Estados Unidos com os outros países, anunciou que revogou os vistos americanos para Moraes, “de seus aliados e de seus familiares imediatos”.
De acordo com fontes do governo federal, além Moraes, tiveram seus vistos suspensos:
Luis Roberto Barroso, o presidente da Corte;
Edson Fachin, vice-presidente;
Dias Toffoli;
Cristiano Zanin;
Flavio Dino;
Cármen Lúcia; e
Gilmar Mendes.
Além dos ministros, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, também teve a permissão para entrar nos Estados Unidos Suspensa.
Os ministros André Mendonça, Nunes Marques e Luiz Fux ficaram de fora da lista.
Ministros durante a sessão plenária do STF.
Carlos Moura/SCO/STF
Reação do governo
Neste sábado (19), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) emitiu uma nota na qual manifesta “solidariedade e apoio” aos ministros do STF atingidos pela revogação de vistos dos Estados Unidos.
Segundo ele, essa é “mais uma medida arbitrária e completamente sem fundamento do governo dos Estados Unidos”.
“A interferência de um país no sistema de Justiça de outro é inaceitável e fere os princípios básicos do respeito e da soberania entre as nações”, acrescentou Lula.
O presidente também se reuniu com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. No encontro, que não estava previsto na agenda oficial, a crise com os EUA também foi debatida.
A suspensão dos vistos
Ao anunciar a medida, Rubio disse que Trump deixou claro que o governo norte-americano responsabilizará estrangeiros responsáveis pela censura de expressão protegida nos Estados Unidos.
“A caça às bruxas política do Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, contra Jair Bolsonaro criou um complexo de perseguição e censura tão abrangente que não apenas viola direitos básicos dos brasileiros, mas também se estende além das fronteiras do Brasil, atingindo os americanos”, diz a postagem de Rubio na rede social X.
A decisão ocorreu no mesmo dia em que Moraes determinou o uso de tornozeleira eletrônica pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), aliado de Trump.
De acordo com Moraes, ficaram caracterizados os crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa e atentado à soberania por parte de Bolsonaro.
Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), havia “concreta possibilidade” de fuga do ex-presidente.
Associação de procuradores repudia medida
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) divulgou nota relatando “preocupação” com a decisão do governo dos EUA. A organização classificou a decisão como “inaceitável tentativa de intimidação” e “desrespeito à soberania nacional e ao princípio da não intervenção”.
Segundo a entidade, a medida é um gesto “desproporcional” e “incompatível” com a trajetória de Gonet, que é descrito pela entidade como um membro respeitado do Ministério Público Federal (MPF), com atuação marcada pela defesa da Constituição e das leis brasileiras.
Procurador-Geral da República, Dr. Paulo Gustavo Gonet Branco
Antonio Augusto/STF
“A revogação de seu visto representa não apenas um gesto desproporcional e incompatível com o histórico de atuação técnica do Procurador-Geral da República, mas também uma ofensa à independência e à autonomia de todo o Ministério Público brasileiro”, diz a nota.
A ANPR reforçou que o Ministério Público e o Poder Judiciário no Brasil atuam de forma independente e que nenhum agente público deve ser punido por cumprir sua função constitucional — especialmente por um governo estrangeiro.
A associação informou que está acompanhando o caso de perto e prestando apoio institucional ao procurador Paulo Gonet.