Memes, collabs e eventos com influencers: as estratégias do STF para ganhar seguidores

A estratégia de comunicação foi iniciada pelo STF em 2020 e intensificada no último ano. O humor é uma das ferramentas adotadas. O objetivo é conquistar seguidores para que as informações do órgão alcancem pessoas dos mais diversos segmentos da sociedade, inclusive de espectros políticos diferentes. Em um vídeo no perfil do Supremo Tribunal Federal (STF) na rede social X, em maio, a espada da famosa estátua da Justiça se transformou em um sabre de luz, a arma do universo Star Wars. A hashtag #StarWarsDay justifica o post, feito no dia em que os fãs compartilhavam conteúdos relacionados aos filmes da franquia.
No mês seguinte, o perfil do STF no Instagram deixou um comentário em um post do humorista paraibano Mizael Silva. Ele tem mais de 3 milhões de seguidores e faz sucesso com vídeos em que diz ser advogado do ministro Alexandre de Moraes.
“Dr. Mizael, advogado de Alexandre de Moraes, favor checar seu inbox da melhor forma”, escreveu o perfil oficial do órgão.
Espada da estátua da Justiça se transformou em um sabre de luz
Reprodução
De acordo com o órgão, o objetivo é um só: conquistar seguidores para que suas informações alcancem pessoas dos mais diversos segmentos da sociedade, inclusive de espectros políticos diferentes.
Postagens como essas fazem parte de uma estratégia de comunicação iniciada pelo STF em 2020 e intensificada no último ano por meio de memes, collabs e parcerias com personalidades da internet.
“Nada é à toa. Nenhum post é publicado, mesmo de piadinha, que não tenha o intuito de aumentar o número de seguidores”, disse o STF.
A estratégia vem dando resultado. Dados do STF obtidos pelo g1 mostram que, entre outubro de 2023 e maio de 2025, as postagens alcançaram mais de 99 milhões de pessoas. No mesmo período, foram mais de 240 mil novos seguidores só no Instagram — cerca de 420 pessoas seguindo o perfil por dia.
Na última semana, a Corte esteve ainda mais em evidência. O interrogatório de Jair Bolsonaro, conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes na ação penal que apura a tentativa de golpe de Estado, movimentou a internet com memes e cortes de vídeos.
Segundo o próprio STF, o órgão tem cerca de 150 mil menções nas redes sociais por dia. O número é 250 vezes maior do que a quantidade de notícias sobre a Corte veiculadas diariamente na imprensa.
Na avaliação do STF, se estão falando do órgão, ele precisa participar dessa conversa. Para isso, tem que ganhar seguidores. E, para ganhar seguidores, lança mão de posts bem-humorados e collabs com influencers digitais.
Promovendo o STF
Quem é Mizael, humorista paraibano que se diz ‘advogado de Alexandre de Moraes’
Reprodução/YouTube
A mensagem deixada pelo perfil do STF no Instagram do humorista paraibano Mizael Silva era um convite para a segunda edição do evento “Leis e Likes: o papel do Judiciário e a influência digital”. A primeira aconteceu em agosto de 2024.
Promovido em parceria com o projeto de educação midiática Redes Cordiais, projeto que capacita comunicadores e influenciadores digitais para combater a desinformação e o discurso de ódio nas redes sociais, o próximo encontro reunirá 25 influenciadores digitais.
Segundo dados do STF, a primeira edição rendeu mais de 400 conteúdos produzidos durante o evento e ampliou em 30% a imagem positiva do órgão na imprensa. Collabs posteriores fizeram com que mensagens-chave do STF chegassem a até 80% de não seguidores do perfil @supremotribunalfederal no Instagram.
Não foi a primeira vez que o STF interagiu com humoristas. Em março de 2025, o órgão fez uma parceria com o grupo Porta dos Fundos para a produção de conteúdos educativos sobre direitos das mulheres.
Os vídeos, lançados no Dia Internacional da Mulher, utilizaram linguagem cômica para conscientizar sobre feminicídio e violência doméstica.
Influencers no evento ‘Leis e Likes: Papel do Judiciário e Influência Digital’
Gustavo Moreno/STF
Pesquisadora aponta para risco na estratégia
Segundo Grazielle Albuquerque, cientista política e autora do livro “Da lei aos desejos: o agendamento estratégico do STF”, o órgão acerta ao se comunicar de acordo com o meio. No caso das redes sociais, a descontração é a forma mais adequada, segundo a pesquisadora.
Mas ela observa que há um risco quando o STF se associa a um agente externo e opta pela tônica do humor. “O órgão aumenta a difusão da mensagem, mas não controla a recepção. Isso pode impactar na sua legitimidade a longo prazo”, disse Albuquerque.
De acordo com um levantamento do instituto de pesquisa Quaest, no primeiro trimestre de 2023, 74% das menções ao STF foram negativas. Ao menos uma a cada três, vieram de comportamentos inautênticos, ou seja, provavelmente de robôs.
Para a diretora executiva do projeto Redes Cordiais, Clara Becker, o humor pode ser a melhor ferramenta para se aproximar do público, comunicar ideias difíceis e furar bolhas em uma sociedade tão polarizada.
“Esses influenciadores conseguem traduzir tudo com muita autenticidade, numa linguagem acessível, falando com bastante capilaridade e credibilidade para seus seguidores”, disse.
Um caminho sem volta
O STF levou 15 anos para ampliar sua participação nas redes sociais, desde que criou o primeiro perfil. O canal da Corte no Youtube foi criado em 2005 e servia apenas para transmitir as sessões. Já o X foi criado em 2009, mas era atualizado apenas com os links das matérias do site.
A grande mudança aconteceu a partir de 2020, com a criação de perfis em todas as principais redes sociais e a definição de conteúdo próprio e linha editorial específica para cada uma delas.
Em julho de 2024, o STF somava 3,8 milhões de seguidores em sete plataformas: Youtube, Facebook, Instagram, Tik Tok, Whatsapp e Linkedin. O órgão ainda tem perfis no Spotify, no Thread e no Kwai, mas não publica nas últimas duas redes.
Se, antes, só uma pessoa era responsável pelas redes sociais do STF, hoje, a equipe de comunicação é formada por 11 profissionais que produzem 500 posts por mês, todos com estratégia bem definida.
Ao menos três eventos com influenciadores digitais foram realizados desde 2024.
Em maio daquele ano, o presidente do órgão, ministro Luís Roberto Barroso, se reuniu com 14 personalidades da internet e o diretor de Políticas Públicas do TikTok no Brasil, Fernando Gallo.
O grupo debateu sobre como tornar o Judiciário mais acessível ao público jovem e conectado. Juntos, os influencers, entre eles a advogada Gabriella Prioli, somavam quase 15 milhões de seguidores do TikTok.
Já em junho de 2025, o ministro Barroso se reuniu com 10 criadores de conteúdo na sede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Para o STF, ações como essas são um caminho sem volta, que independe do presidente da Corte. “É uma estratégia institucional e de comunicação”, disse o órgão.